bate-bola

As melhores entrevistas do basquete feminino no Brasil

quinta-feira, junho 14, 2007

Érica Vicente

A armadora Érica Vicente é cria do interior paulista. Como atleta adulta, defendeu as equipes do Jomec/Rio Preto (1996), BCN (1997), Ulbra (1998) e Santa Bárbara D'Oeste (1998). Neste ano, a atleta resolveu alçar vôos mais longos e cheia de coragem, rumou para os EUA. Hoje, pertence à elite da NCAA (a mais importante liga universitária do país) e fala, com exclusividade ao PBF.

1) O assunto do momento é a sua participação do Final Four da NCAA, mas vamos voltar ao tempo. Onde você nasceu? Quando e onde você começou a praticar basquete? Quem foram os técnicos que te iniciaram no esporte?
Nasci em Jundiaí, interior de São Paulo no dia 22 de abril de 1976. Comecei a jogar em 1986 nas escolinhas do Colégio Divino Salvador. Minha minha primeira técnica foi Jeannine Ferrari Chagas, mas também trabalhei com o técnico Borracha por um ano quando ainda estava na categoria mini.
2) Nas categorias juvenis, por quais clubes você passou?
Joguei por Jundiaí, mas eu ainda era infanto e foi em Santo André (Lacta), e em seguida na Unimep de Piracicaba que foram meus últimos anos como juvenil.
3) Você foi convocada para a disputa do Mundial Juvenil de 1993, não foi? Chegou a participar do torneio?
Sim, mas fui cortada indo apenas para o Sul-Americano no Paraguai. Foi uma experiência muito importante. Mesmo sendo infanto, fui convocada. E também por ter treinado com jogadoras que hoje são grandes nomes do basquete nacional.
4) A conquista do Campeonato Paulista de 1997 pelo BCN/Osasco foi a sua primeira participação em uma equipe adulta? Fale um pouco dessa conquista, do grupo formado pelo BCN e da convivência e dos ensinamentos da técnica Maria Helena Cardoso.
Na verdade já vinha participando de equipes adultas sendo juvenil mas acho que foi no BCN umas das melhores experiências como adulta, por termos conquistado o Campeonato Paulista. Tínhamos um time jovem e que poucas pessoas acreditavam, mas com o excelente trabalho da Técnica Maria Helena, nos tornamos um time unido e com força total.
5) Encerrado o Paulista daquele ano, você transferiu-se para o time da Ulbra, em Canoas (RS) para a disputa do I Nacional de Basquete Feminino. Como foi essa experiência? Como foi trabalhar com o técnico Paulo Bassul (hoje técnico da seleção juvenil)?
Foi uma experiência muito legal e gostei muito de ter trabalhado com o técnico Paulinho. Ele é muito inteligente e uma pessoa que sempre te da forca. E foi nessa equipe que surgiu a oportunidade de jogar nos Estados Unidos.
6) No início da temporada de 1998, você foi para o Canatiba/Santa Bárbara d'Oeste, que comandado pela técnica Nilcéia Ravanelli, conquistou o Campeonato Paulista da Divisão A-2. Após esta conquista, você rumou para o basquete universitário norte-americano. Quais foram os fatores que pesaram nesta decisão?

Antes de jogar em Santa Bárbara eu já havia decidido o que iria fazer, então estava procurando um time pra jogar apenas o primeiro semestre, já que partiria em agosto. Conversei com a técnica Nilcéia e deu tudo certo. Gostei muito de trabalhar com aquela equipe e fomos campeãs do Campeonato A2, sendo minha primeira experiência nessa divisão. Eu já estava decidida porque alem de jogar nos Estados Unidos também iria estudar e como basquete não é pra sempre e eu já estava com 22 anos, não pensei duas vezes!!!

7) Como você chegou ao basquete nos EUA? Quem te indicou? Para que universidade você foi? Em que curso você se encaixou?
Cheguei no basquete americano através do técnico Jose Medalha. Conheci Medalha quando estava na equipe Ulbra, ele estava como nosso diretor. Como Medalha já tinha contatos nos Estados Unidos, por ter vivido e também porque seu filho Eric Medalha já estava por lá, ele me indicou um técnico de Oklahoma. Fui para um Junior College( Bacone College) em Oklahoma que é uma universidade, só que menor, já que não falava nada do inglês. No Junior College você só pode ficar por dois anos e tive a sorte de ser recrutada depois dos meus dois anos pelas melhores universidades Division I dos Estados Unidos e que hoje estou em uma delas - a Southwest Missouri State University. Estou cursando International Business e como minor Sports Administration.
8) Como foram os momentos iniciais nos EUA?
Não foi tão difícil como eu pensava (apesar de saber apenas algumas palavras em inglês). também tive a sorte de vir com outra brasileira - a Erika Rante - e acho que isso ajudou bastante. E claro que ficar longe da família e dos amigos é sempre difícil, principalmente quando você vai para um lugar que você não imagina como vai ser ou até mesmo que tipo de pessoas você vai encontrar, mas Graças a Deus foi recebida muito bem e os americanos me ajudaram muito. Eu estava começando uma vida nova!
9) Quais as diferenças principais entre o treinamento nos EUA e no Brasil em relação à quantidade e à qualidade?
No Junior College treinávamos uma vez por dia já que estudávamos de manhã. Mas agora divisão I e totalmente diferente. Aqui eles separam em três partes: o pre-season, o in-season e o post-season. No pre-season fazemos testes, musculação e muita parte física. Costumamos a treinar 6:30 da manha musculação e a tarde corrida e pick up games. Ficamos geralmente dois meses nisso e a partir de outubro e que começa o "real practice" como eles chamam. Nesse período que já e o in-season só treinamos na quadra e às vezes musculação. O treinamento em quadra costuma a durar 3 ou 3 horas e meia...e bastante puxado! Aqui tudo é muito certinho por isso dá para programar os treinos desde o começo ate o fim e no Brasil como ha vários torneios (Jogos Regionais, Abertos, Paulista...) às vezes o calendário se torna bastante confuso. Eu acho que nos Estados Unidos as atletas são mais fortes em temos de parte física e, no Brasil, é mais o talento que conta, porque no treinamento de musculação aqui nos Estados Unidos a quantidade é bem maior. Acho que na qualidade não tem tanta diferença, só a defesa é que pesa um pouco, realmente por aqui e bem mais forte. E pra finalizar vem o post-season, não temos mais treino com bola, apenas alguns "rachões" (hehehe),musculação, corrida.
10) Como tem sido a sua trajetória por aí até chegar a disputa do Final Four neste ano? Fale um pouco sobre a sua participação nesta temporada, os momentos mais marcantes, etc.
Desde o primeiro dia que cheguei nessa universidade o objetivo era o Final Four, por isso treinamos muito para chegar ate lá. Por aqui os campeonatos são divididos por regiões, devido aos 300 times que participam da Divisão I, então ficamos campeãs da nossa região e fomos para o NCAA Tournament que são todos os campeões de cada região num total de 64 times. A nossa trajetória foi maluca. Em menos de duas semanas cruzamos o pais de um lado para o outro. Em New Jersey vencemos um dos times mais fortes e seguimos para Washington State onde vencemos os dono da casa e Duke. Não foi nada fácil, mas enfim deu tudo certo. O que mais me impressionou foi que a cada lugar que fossemos sempre havia um grupo de mais ou menos 200 pessoas que nos acompanhavam.
11) O seu time acabou sendo eliminado nas semifinais, não é? Como foram os últimos jogos?

Sim ,não conseguimos ir para a final, não jogamos muito bem devido ao nosso cansaço por falta de tempo pra descansar, mudança de horário, etc...Mas valeu!!! É muito difícil chegar entre o quatros melhores times do país e por isso eles dão muita importância para esse Final Four. A cidade inteira estava nos esperando mesmo com a derrota. Eu tive a sorte de vim pra cá, o basquete e o principal esporte dessa cidade (Springfield) e o pessoal e maluco pelo time. Acho que pra mim está sendo um dos melhores lugar pra se jogar, onde a cada jogo tínhamos mais de dez mil pessoas nos assistindo.

12) Uma outra Érika faz parte do seu time: a pivô Érika Rante. Como ela tem se saído por aí? Existem outras brasileiras jogando na NCAA? A Jacqueline Godoy participa de algum time do torneio?

A Erika Rante foi muito bem e é uma das melhores pivôs que temos por aqui. A gente se entende muito bem dentro de quadra o que facilita o nosso trabalho. Não conheço mais ninguém que esteja jogando NCAA de mulher, mas conheço muitas garotas que estão no junior college como eu comecei e que também estão sendo recrutadas por grandes universidades. A Jacque está na liga NAIA e que também e uma liga forte. Eu acho que a única diferença e que nessa liga não importa a idade que você tenha que você pode jogar. Já a NCAA vai até os 25-26 anos, se eu não me engano.
13) Qual a reação das suas colegas norte-americanas quando sabem da sua nacionalidade? Existe algum tipo de preconceito? Quais são os referenciais do basquete brasileiro para os norte-americanos?
O Brasileiro e querido em qualquer lugar do mundo, não sei eu acho que temos um jeito especial que cativa as pessoas, mas quando se trata de rivalidade elas não querem nem saber de onde você vem, é porrada mesmo!!! No começo elas podem até assustar mas depois você mostra seu trabalho e então elas abaixam a bola. Não tive nenhum tipo de preconceito até agora. O americano gosta muito do basquete brasileiro eles dizem que somos mágicos, devido as habilidades, os passes...O duro é que ainda tem alguns americanos que pensam que o Brasil só tem "soccer" como eles dizem!!!
14) Quais são seus planos para os próximos anos? Você pensa em retornar ao Brasil?

Tenho mais um ano de basquete e espero me formar o ano que vem. Gostaria muito de voltar para o Brasil, jogar numa equipe quem sabe...mas só volto se as oportunidades forem boas, ao contrário ficarei por aqui.

15) Continuando no basquete universitário norte-americano, você pode estar mais perto de uma vaga na WNBA? Você tem esse projeto?
Acho que as chances por aqui são mais fáceis porque a cada jogo sempre tem algum técnico te olhando. Eu gostaria muito, se eu tiver oportunidade estarei pronta.
16) Você pensa em brigar por uma convocação para a seleção brasileira?
É claro que toda atleta tem o sonho de participar da seleção de seu pais, eu nunca vou dizer que eu não quero brigar por isso, mas infelizmente as oportunidades parecem que diminuem a cada dia. Mas se precisarem de mim, estarei a disposição!!!
17) Você faz parte de uma geração que está ocupando progressivamente o espaço deixado por Paula e Hortência, com atletas como Silvinha, Alessandra e Leila. Como você analisa o momento do basquete brasileiro internacionalmente?
O time do Brasil esta passando por uma renovação, mas mesmo assim eu acredito que esta entre os melhores do mundo. As atletas brasileiras são guerreiras e mesmo passando por tanta dificuldade conseguem fazer bonito. E o basquete brasileiro é respeitado porque queira ou não já fomos campeãs do mundo e medalhas de prata e bronze nas Olimpíadas!!!
18) Participando do universo de formação de atletas nos EUA (as universidades), você pode responder: o trabalho de base no Brasil está muito atrasado em relação às grandes potências do esporte? Compare a sua formação no Brasil (incentivo, recompensas, infra-estrutura) com a que uma atleta norte-americana recebe na sua formação?
Eu acho que a formação do Brasil não é ruim. Uma coisa que o Brasil está na frente é que jogadoras jovens tem a chance de treinarem e jogarem com time adulto o que não acontece aqui. As meninas americanas quando chegam na idade dos 20, 21 são mais "verdes" que as nossas porque elas não tem essa oportunidade de amadurecerem mais cedo. Agora em termos de incentivo, estrutura...não tem nem o que falar. Aqui todas as escolas tem todos os tipos de esportes, só não joga quem realmente não quer. O incentivo é muito grande, aqui tudo tem um prêmio: por você marcar bem, pegar rebote, sofrer falta de ataque, assistência, melhor nota na escola ou por marcar mais pontos é claro. Então dá gosto de jogar, mesmo que você faca 1 ponto, mas mostre raça, ou pegue 20 rebotes eles te darão valor. A mídia também e muito importante, dá uma ajuda enorme. Os ginásios são coisas de outro mundo, tudo muito bem feito, com vestiários, salas de fisioterapia, musculação,piscina, tudo que uma atleta realmente precisa. Eu acho que o Basquete no Brasil é mais como um emprego, onde as jogadoras são os empregados que recebem salário.

19) O Bate-bola para encerrar:

O jogo que eu não esqueço: jogo do Final Four

O jogo que eu tento esquecer e não consigo: o jogo final do NJCAA(junior college) onde perdemos na prorrogação.
Um time: Perdigão Divino
Um campeonato: NCAA
Um(a) técnico(a): Aquele que te dá oportunidade
Uma colega: além de minha irmã, também a Erika Rante
Uma estrangeira: duas- a Edna Campbell e a Jackie Stiles
Uma quadra: SMS GYM, dez mil pessoas a cada jogo.
A bola que eu chutei e caiu: uma do meio da quadra
A bola que eu chutei e não caiu: um lance livre
Uma marcadora implacável: Nádia
Os brasileiros ficaram muito orgulhosos por essa sua temporada vitoriosa. Muito sucesso, sorte e saúde para você. Obrigado pela entrevista.
Eu é que agradeço pela oportunidade e sempre que precisar e só me dar um alô. Um grande beijo pra todos que curtem o Painel do Basquete!